A Ordem Artiodactyla é uma das mais diversas dentro do grupo dos vertebrados. Se você também tem dúvida sobre a ordem Certatiodactyla você não está no caminho errado. Leia o post para entender porque os dois nomes são válidos e podem ser utilizados. Ah! Mas se você ouviu alguma coisa associada a Ordem Perissodactyla, não se preocupe! Está tudo explicadinho no texto abaixo.
- Agrupando as espécies por suas características comuns
- Características e curiosidades da Ordem Artiodactyla
- Artiodactilos domésticos
- Baleias pertencem a Ordem Artiodactyla? Como isso é possível?
- Eu não estava brincando quando disse que a Ordem acolhe os unicórnios!
- Ordem Artiodactyla e seus representantes chifrudos
Agrupando as espécies por suas características comuns
Na biologia, uma combinação de especialidades, avalia, agrupa e reagrupa os seres vivos, por seus “jeitões” (simplificando bem as etapas que isso envolve). Temos os grupos dos peixes, dos fungos, das aves, dos insetos e por aí vai. Ocorre que, dentro dos grupos, muitas vezes fica difícil organizar as coisas. Neste post falaremos um pouco sobre um grupo específico e altamente diversificado de mamíferos. Talvez, o mais diversificado da Classe Mammalia.
Você provavelmente já viu esse cara aqui e disse: isso é um veado!
E depois viu esse outro e falou: isso também é veado!
E aí veio um biólogo mala qualquer e disse: isso é um antílope e isso é um veado! A sentença está correta, mas o fato é que até os biólogos se confundem! Agora, aposto que você não olhou para um hipopótamo e disse: mas que carinha de primo do veado que ele tem!
Se você acha que o assunto não rende o seu interesse, talvez eu te convença a ir um pouco mais além se eu te contar que esses caras aí de cima e as baleias também têm muita coisa em comum…E com porcos, camelos, girafas também!
Que confusão!
Características e curiosidades da Ordem Artiodactyla
De fato, a reunião de bichos tão distintos num mesmo grupo é motivo de estudos e debates até os dias atuais. E não devo me aprofundar nessa discussão. Mas aquele provérbio que diz que são parecidos das pontas dos dedos até o último fio de cabelo parece caber bem para explicar algumas características/curiosidades da Ordem Artiodactyla. Nela estão contidos os mamíferos de dedos pares, um dos grupos animais mais bem sucedidos do planeta, com distribuição geográfica ampla (exceto Antártica, e até recente invasão, na Austrália) e ocorrência em ambientes diversos.
Parte desse sucesso, vem do aparato para serem bons corredores e conseguirem escapar dos predadores, condição alcançada em decorrência do alongamento dos ossos metatarsais e metacarpais (equivalente humano a sola dos pés e palmas das mãos, respectivamente) e redução no número de dedos. Esses animais centralizam o eixo do corpo no terceiro e quarto dedo, possuem redução ou perda variável de segundo e quinto dedos e perda do primeiro. Menos dedos, menos músculos e tendões e, portanto, maior otimização energética na locomoção. Os dois dedos, ficam ainda, protegidos por um casco fendido. Outras características completam a eficiência de fuga: olhos laterais, olfato e audição apurados.
Artiodactilos domésticos
Os artiodátilos formam o grupo de animais mais intimamente associados aos seres humanos, seja pelo histórico de domesticação, seja pela apreciação para caça. São, em sua maioria, herbívoros, com exceção dos porcos que são onívoros e das baleias que são carnívoras. Apresentam compartimentalização do estômago, embora camelos, hipopótamos e porcos não sejam considerados ruminantes típicos, como os demais integrantes da Ordem.
**Apenas para destacar a distinção, a Ordem Peryssodactyla (zebras, cavalos e rinocerontes) agrupa os ungulados de dedos ímpares. Neles o peso dos animais fica centralizado no terceiro dedo, sempre maior que os demais, – quando existe mais de um.
Baleias pertencem a Ordem Artiodactyla? Como isso é possível?
Certo! Então já sabemos que os artiodáctilos se apoiam, de fato, nas pontas dos dedos. Mas…e as baleias? As baleias descenderam de um representante quadrúpede terrestre com casco, é por isso, que baleias, golfinhos e botos (cetáceos) se agrupam na Ordem, ou como alguns preferem chamar Cetartiodactyla; um táxon que agruparia cetáceos com mamíferos de dedos pares.
O fato é que estudos moleculares e morfológicos recentes comprovam a aproximação entre hipopótamos e baleias, sendo a organização evolutiva de todos estes mamíferos em questão (grau de parentesco e descendentes), ainda em discussão, embora já muito bem embasada cientificamente. E é assim, com a ajuda da evolução que a ordem Artiodactyla reúne veados, bois, cabras e ovelhas, porcos, camelos, girafas, antílopes, porcos, hipopótamos e baleias.
Você pode adotar qualquer um dos dois termos: Ordem Artiodactyla ou Certatiodactyla. A verdade é que existem artigos científicos suportando os dois termos, até o presente momento. É mais uma questão de se identificar com a defesa dos argumentos de cada um. O uso de um termo ou outro não excluí nenhum dos diversos animais que lá se agrupam.
Eu sei! Fica difícil acreditar na união de animais tão distintos juntos, mas isso é porque estamos olhando apenas para a história atual do grupo. Se acrescentarmos os fósseis e formos comparando as linhagens intermediárias, ao longo dos milhões de anos, começamos a “digerir” melhor a história. E eu não te dei esses subsídios aqui então fica em paz e acredita na força da evolução! Ela aqui terá que ser aceita como um unicórnio! Você terá que acreditar que ele existe e tem poderes mágicos! Para que não fique tão abstrato, veja essa imagem abaixo de linhagens fósseis da história evolutiva das baleias.
Se você quiser entender mais sobre a evolução dos cetáceas, acesse o vídeo abaixo! Ele é super esclarecedor e profundo no tema
Viu só?! Sim! A evolução é fantástica!
Eu não estava brincando quando disse que a Ordem acolhe os unicórnios!
Mas se você acha que o unicórnio aqui é apenas uma figura de linguagem, enganou-se! Porque se tem uma Ordem capaz de agrupar um unicórnio, certamente seria a Artiodactyla! Você conhece este animal?
A foto é de um narval ou unicórnios-do-mar (Monodon monoceros). E isso não é uma gozação. Esses animais são baleias e, portanto, pertencem ao grupo!! Este maravilhoso chifre, tão peculiar, é na verdade um canino espiralado hiper desenvolvido que se projeta para frente. Sim! O chifre do unicórnio [-do-mar] é na verdade um dente.
Desculpe acabar com o seu conto de fadas. Essa presa, extremamente longa, se projeta pelo lado esquerdo da mandíbula dos machos e vai crescendo ao longo da vida. Unicórnios-do-mar são muito bizarros e para adicionar mais fantasia, vivem junto com o Papai Noel: no Ártico. Vamos combinar que não faltam memes para um bicho desse, não é? Se quiserem que eu fale mais sobre eles; deixem um comentário ao final deste post.
Ordem Artiodactyla e seus representantes chifrudos
Mas já que tocamos no assunto chifre, vamos falar sobre outro aspecto interessante da Ordem Artiodactyla. Você provavelmente já olhou para um boi ou uma vaca e disse: olha só o chifre dela!! E da cabra ou do bode e por aí vai. Mas será que é chifre mesmo? Se você pensou em um dente (guarde essa alucinação só para você e disfarce), eu me referia à opção corno. Sabe a diferença entre eles?
Chifres e cornos são apêndices cranianos. Chifres são ossos que crescem a partir de um pedículo no alto do crânio, com ocorrência apenas nos cervídeos (veados, cervos, renas) que podem ou não serem ramificados, sendo substituídos periodicamente. Cornos são permanentes, não ramificados e cobertos por uma bainha de queratina. São encontrados nos bovídeos (cabras, bois, impalas, gazelas). Existem outros dois tipos de apêndices cranianos no grupo: os ossicones em girafas que também são estruturas ósseas retas e permanentes e os cornos ramificados e decíduos, encontrados somente nas antilocapras (Antilocapra americana).
Uma postagem bem mais detalhada sobre os apêndices cranianos já existe. Basta clicar no link para ter acesso.
Agora você já tem mais embasamento para distinguir veados dos antílopes: nossa provocação inicial. Lembre-se que somente os chifres se ramificam. Ficará muito mais fácil para distinguir esses ungulados daqui para frente! E agora você já sabe também que embora muito diversos, os artiodátilos se associam por caracteres que vão desde as pontas dos pés (literalmente) até o último fio de cabelo, ou talvez um chifre ou corno.
Referências
Agnew, D. Camelidae. Pathology of wildlife and zoo animals. Chap. 7. 2018.
de Miguel, D et al. Key innovations in ruminant evolution: a paleontological perspective. Integrative Zoology. V(9): 412-433. 2014
Spaulding, M et al. Relationships of Cetacea (Artiodactyla) among mammals: Increased taxon sampling alters interpretations of key fossils and character evolution. Plosone. V (4), p: 1-14. 2009
Thewissen, J.G.M et al. From land to water: the origin of whales, dolphins and porpoises. Evo. Edu. Outreach. V(2): 272-288. 2009
Marina Xavier da Silva
Bióloga graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre em Ecologia pela Universidade de São Paulo – USP. Iniciou sua carreira no Parque Nacional do Iguaçu, no Paraná, onde trabalhou por 13 anos, nove deles dedicados à coordenação de um projeto para conservação da onça-pintada no Brasil e Argentina. Mãe da Lia e da Cléo.
1 comentário em “ORDEM ARTIODACTYLA: ANIMAIS DE CASCOS, RUMINANTES, BALEIAS E UNICÓRNIOS”